Desembargadores do TJ-BA afastados na Faroeste ainda recebem auxílio-alimentação

Com R$ 1,3 mil é possível alimentar quantas pessoas? E com R$ 178 mil? Em um contexto de crise econômica e sanitária no país, alguns valores são impossíveis de passarem despercebidos. Ainda mais se levarmos em consideração que o valor do salário mínimo atual é de R$ 1,1 mil, e recebido por muitas pessoas para sustentar uma família.

O montante de R$ 178,2 mil foi pago nos últimos 16 meses pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) aos 11 magistrados afastados na Operação Faroeste. Cada um, ao longo desses meses, recebeu R$ 1,3 mil de auxílio-alimentação. O Bahia Notícias apurou que os magistrados receberam, juntos, entre dezembro de 2019 e junho de 2021, R$ 178,2 mil em auxílio-alimentação. Os desembargadores Maria do Socorro, José Olegário, Gesivaldo Britto, Maria da Graça Osório e os juízes Sérgio Humberto de Quadros Sampaio e Marivalda Moutinho, recebem o benefício desde dezembro de 2019. Cada um recebeu R$ 20,8 mil indevidamente no período.

A desembargadora Sandra Inês Rusciolelli, afastada no final de março de 2019, recebeu de abril de 2020 a junho de 2021 o total de R$ 18,2 mil em benefício de cunho alimentar. Já as desembargadoras Ilona Reis e Lígia Ramos, além do desembargador Ivanilton Santos e o juiz João Batista Alcântara Filho, receberam de janeiro a junho deste ano o total de R$ 31,2 mil em benefícios. Eles foram afastados das funções na última fase da Operação Faroeste, deflagrada em dezembro de 2020.

A verba tem caráter indenizatório, isto é, não integra o salário dos magistrados, e, em tese, somente deveria ser paga para quem está no exercício da função. O próprio sistema do TJ-BA explica que esse tipo de verba é destinado para o pagamento de “auxílio-alimentação, auxílio-transporte, auxílio pré-escolar, auxílio-saúde, auxílio-natalidade, auxílio-moradia, ajuda de custo, além de outras parcelas desta natureza”. No caso, o auxílio-alimentação serviria para que magistrados e servidores pudessem fazer refeições durante a jornada de trabalho. Mas mesmo com o afastamento determinado pelo ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), relator da Operação Faroeste, o TJ-BA continua pagando os valores aos magistrados.

O valor de R$ 1,3 mil foi fixado no último reajuste do benefício, realizado pelo TJ-BA em outubro de 2019. A despesa aparece no contracheque dos magistrados do TJ-BA como “indenização”. Apesar do pagamento do auxílio ser questionado do ponto de vista moral pela sociedade, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já decidiu que magistrados afastados cautelarmente devem continuar recebendo o auxílio-alimentação. 

Em maio de 2019, meses antes da deflagração da 1ª Fase da Operação Faroeste, o CNJ manteve o pagamento de auxílio-alimentação para dois desembargadores do Ceará afastados pelo STJ, por suspeitas de corrupção. O benefício foi mantido para os desembargadores Sérgia Maria Mendonça e Francisco Pedrosa Teixeira, acusados de venda de habeas corpus no Tribunal de Justiça do Ceará (TJ-CE). Em 2017, a presidência do TJ-CE suspendeu o pagamento do benefício, com efeitos retroativos à data do afastamento dos magistrados, em setembro de 2016. 

O argumento do CNJ para manter o pagamento do auxílio, mesmo sem o exercício das atividades, é a “presunção de inocência”, pois, na época, o inquérito contra os desembargadores do Ceará ainda não havia sido concluído. A conselheira Maria Tereza Uille Gomes, relatora do caso,  afirmou que o afastamento poderia ser revogado a qualquer momento. “Extirpar o auxílio-alimentação sem a efetiva comprovação da responsabilidade disciplinar do magistrado configura, à toda evidência, verdadeira inversão da presunção de inocência”, diz a conselheira em seu voto.

O conselheiro André Godinho divergiu do entendimento no julgamento da questão mas foi voto vencido. Para ele, “o auxílio-alimentação constitui vantagem funcional de caráter indenizatório que deve estar atrelado à prestação das atividades institucionais”, enquanto estas durarem. “Logo, se o benefício é devido em razão do exercício das funções institucionais da magistratura, o afastamento do magistrado do exercício das funções, ainda que mantido o recebimento de subsídios, faz cessar o direito à percepção do benefício”, diz Godinho seu voto.

Em nota, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) defendeu que vem cumprindo integralmente a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determinou o afastamento cautelar, ad referendum da Corte Especial, sem prejuízo da remuneração dos cargos dos Desembargadores e Juízes afastados. “O artigo 27 da Lei Orgânica da Magistratura proíbe a suspensão do pagamento de vencimentos e vantagens, nas hipóteses de julgadores afastados do exercício das suas funções em razão da instauração de PAD, até a decisão final. A decisão de descontar o valor do auxílio alimentação das verbas recebidas pelo magistrado afastado, precisa de respaldo legal e a efetiva comprovação de sua responsabilidade disciplinar. Qualquer decisão contrária, pode configurar antecipação da culpa e da própria pena”, diz a nota encaminhada ao Bahia Notícias.

O TJ-BA reforça ainda que o procedimento adotado encontra-se em conformidade com entendimento do Conselho Nacional de Justiça, haja vista o quanto decidido no pedido de providências n° 0002071-38.2019.2.00.0000 e procedimento de controle administrativo 0001180-22.2016.2.00.0000. (Atualizado às 10h03)

Fonte: Bahia Notícias

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